Fado incerto

por Anónimo em terça-feira, 7 de abril de 2009


"Não parei de pensar desde a última vez que tivemos juntos. Tudo é mais difícil agora e não te sei explicar porquê. Quer dizer, o sentimento é tão claro e óbvio, mas por outro lado não vejo uma palavra que o descreva na perfeição. Talvez porque custe ser claro para os outros, talvez porque me apeteça fugir desse confronto. Não sei ao certo o que torna isto tão mas tão árduo e não sei como tirar estas cordas dos meus braços e pernas. Prometi dar-te um presente, fi-lo em forma de escolha, numa mão tinhas uma pequena marioneta (bastante catita) na outra mão tinhas a mais hedionda rosa. A tua escolha, amarga a meus olhos, nunca foi clara. Digo-te hoje o que significava cada: a marioneta, era eu, podias (e se calhar sempre o fizeste) brincar comigo, estrangular-me, desmembrar-me, odiar-me, fazer preces à Fortuna para que me magoasse; a hedionda rosa, era e será sempre a mesma peça de teatro, o mesmo palco onde tu e eu nos perdemos constantemente e nenhum de nós se levanta e assume posição. Não sei ao certo o que é que escolheste deste presente nunca desejado por ti, mas como oferta tinhas que o receber, pois odiares-me é fácil, mas fazê-lo friamente e claro é coisa que de ti nunca esperarei. De ti e de qualquer outrem que se diga pessoa, não é assim? A vida tem destas coisas, ser-se inocente ao ponto de se acreditar no Homem.

Quero-te falar do ódio e como sinto que é perda de tempo. Li em tempos que nunca deviamos perder tempo a explicar ódio e desgosto por alguém quando podiamos aproveitar tais momentos para demonstrar amor por aqueles que gostamos. Sábias palavras e se isto foi algo que sempre senti até hoje, depois de lidas (aquelas palavras) tornou-se fé, fanatismo, religião. Amar em vez de odiar, é assim tão difícil? E aqueles momentos em que somos sinceros, mas que para terceiros somos tão frios que magoamos os outros? Paradoxo? Provavelmente quando somos frios e magoamos só queremos o melhor para essas pessoas e quiçá depois de tanta frieza elas crescem no agir e tornam-se mais afáveis, alegres e amorosas.
Penso no que te digo e sinto-me estúpido, falo-te de amor. Coisa estúpida essa, não é? Para que falar de amor se podemos perder o nosso dia a falar de todas as outras coisas que nos afastam dele? Se podemos discutir tudo o que é importante para manter os teatros, essas hediondas rosas. Digo-te, em qualquer ocupação tua, vais encontrar amor. Olha, o caso daqueles mesquinhos advogados e senhores do direito, eles a serem tal, amam a justiça, não é assim? Seja lá o que ela for, afinal de contas é so mais um anelo subjectivo de cada um, certo? Podes não acreditar no que te digo, não é censurável.
Gosto de perder horas a descrever o amor com amor na fala e se tal acção se confunde com alguma fragilidade minha, apenas vos digo na minha humilde posição que têm que ser livres (se assim o desejarem).

Mas, não me quero perder neste devaneio, voltemos ao início: "Não parei de pensar desde a última vez que tivemos juntos". Sei o que dizer em seguida, sei o que pensar, sei o que esperar e desesperar, mas não sei o que fazer concretamente. É tudo tão confuso, mas já não parte de mim. É certo que amo, amo as pessoas, mas já dei tanto, porque tem que partir de mim? Cada vez mais a minha alma se liberta e todas as correntes passam de mim para ti (vós)."

Um dia, talvez, o cansaço crescerá em mim de tal forma que falar de amor me provocará enjoo. Nesse triste (e que triste) dia, deixarei de ser Homem, não é assim?"

Um comentário

Como já tinha dito:)
excepcional

vejo-me reflectida nestes excertos:

"É certo que amo, amo as pessoas, mas já dei tanto, porque tem que partir de mim?"

"Amar em vez de odiar, é assim tão difícil?"

"Prometi dar-te um presente, fi-lo em forma de escolha, numa mão tinhas uma pequena marioneta (bastante catita) na outra mão tinhas a mais hedionda rosa"


As vezes que parámos frente ao espelho a fazer perguntas e reflexões tão pronfundas como estas cujas respostas são um mistério mas o mistério desvendado seria a resposta para descomplexifixar muitas outras coisas. Para as pessoas teimam em permanecer cegas, surdas e mudas.

:(

by Cláudia Isabel on 17 de abril de 2009 às 17:43. #