Manias

por Sara Morgado em domingo, 15 de março de 2009

Odeio a nova mania de ter de gostar de tudo o que é complicado em detrimento das coisas simples. Odeio aquela nova mania de ter de gostar só do que é alternativo/complexo/soturno/melancólico/filosófico ou outra coisa qualquer do género, para dar aquele ar superior de quem só pode perder tempo com elevados pensamentos, gostos únicos e próprios de alguém abençoado em inteligência.
Nesta nova mania, parece que há algo de errado em apreciar uma coisa, só por apreciar. Independentemente de rótulos. Provar uma coisa simples e mundana e gostar parece ser o pecado da nova moda. Existe agora uma espécie de medo em baixar as guardas e saborear coisas simples como humanos. Não se igualar gostos ou não se render a coisas boas, puras e terrenas, só porque temos medo de nos tornarmos “terrivelmente” banais, parece-me ser uma moda que está para durar.
Essa moda é mais ou menos assim: queremos ser tão descomplexados e filantrópicos que acabamos por ser igualmente preconceituosos.
Isto tudo por causa do novo filme do Woody Allen: Vicky Cristina Barcelona. Ao que parece o filme tem qualquer coisa de simples ou não sei o quê que põe as pessoas em choque perante tamanha comercialidade.
O filme é mesmo bom, exactamente por ser tão descomplexado. Por ser simples, quente, vivo e ser, acima de tudo, tão rico, com tantas experiências. Não tem medo de cair no lado oposto desta nova mania: o Woody Allen não o teve, de facto, e criou um filme sem preconceitos, onde não há mal em nos rendermos à cidade quente de Barcelona, às noites com guitarras, às mulheres e aos homens e ao bom vinho ao jantar.
De fraco e de oco o filme não tem nada e o Woody Allen conseguiu quebrar etiquetas.

3 comentários

O teu texto fez-me pensar naquele anúncio da super bock, que já passou na tv e que agora passa muito no cinema.
Há a música entre o melancólico e o nostágico e o rol de situações do quotidiano bonitas e particulares de um dia em casa sozinho ou de uma noite com amigos é extenso. Muitas delas são lugares-comuns de filmes de cinema.
Esta foi a primeira avaliação que fiz para mim mesmo quando vi o dito anúnicio.
Mas.... e então? Porra, o anúncio está maravilhoso! Transpira saudade e paixão a cada imagem...
É como dizes: qual é esse crime de apreciar o simples, o banal? Esta é uma questão que coloco criticamente a mim mesmo numerosas vezes... E acho que a resposta deve ser apenas: aprecia! Mas implica um exercício interior talvez tão intenso como o do homem-vulgar para apreciar aquilo que é alternativo...
já estou a complicar. :)

by Francisco on 15 de março de 2009 às 19:34. #

Eu adoro o Woody Allen mas, de facto, não acho que VCB seja tão bom como os outros filmes que o mesmo realizou. Na minha opiniao, são várias as lacunas do filme ou partes que ficam aquém do que eu sei que ele poderia ter feito. Se há pessoas que ficam em choque são as que conhecem bem a obra do Woody. Eu fiquei. Esperava melhor. Porém, os gostos são para ser discutiveis e acima de tudo respeitados.
Mas concordo perfeitamente contigo que seja ridiculo a mania de não se poder (ou ser-se censurado por) gostar de coisas simples. Bom texto o teu, Sara.

by Inês Guedes on 15 de março de 2009 às 20:13. #

sara,

toda, toda a razão.
eu, que já ressonei a bom ressonar nalgumas obras "pseudo alternativas" e até em alguns filmes do woody, adorei o filme. fui para casa bem disposto, e satisfeito por ver que algumas ideias sobre a vida partilho-as com o realizador.

mas vá lá, eu não sou, definitivamente, do meu século :P

by Manuel Marques Pinto de Rezende on 15 de março de 2009 às 22:38. #